10/25/2007

Falácias

O Jornal de Notícias disponibiliza aqui a lista completa dos resultados dos exames no Secundário com escala de 0-200.
Para escola pública e privada fiz um exercício simples: multipliquei o número de exames de cada escola pela nota média. Após isso somei todos esses valores e dividi o resultado pelo número total de exames no público e igualmente no privado.
Procurei assim obter uma média ponderada para o ensino público e outra para o ensino privado.
Resultados:
Privado- 108,29
Público- 100,48
Ou seja, na escala de 0-20, 0,78 décimas de diferença
Parece que, ao contrário do que eu pensava, o ensino privado não é assim tão melhor que o ensino público.
Há muito pai que comprou gato por lebre, no entanto não tem sido isto anunciado pela comunicação social.

Adenda:

Muitos órgãos de comunicação social consideraram apenas as escolas com 100 ou mais exames realizados.
Vejamos os resultados totais e com essa restrição bem como as suas consequências no meu "estudo", nomeadamente a sua influência na "média", a percentagem de exames que passam a não ser considerados em cada um dos grupos e a consequência na variação da "média" bem como na diferença entre público e privado:

Não me parece muito correcta uma análise que, procurando fazer o confronto entre público e privado, deixa de fora 13,5% dos elementos de um dos grupos. Menos ainda concluir ou procurar dar a entender algo quando só se fala das escolas de topo.
Como é esperado as escolas privadas conseguem melhores resultados, curiosamente pouco melhores, mas daí a retirar a ilação de ser o ensino privado melhor vai uma grande distância.
Suponho que será melhor em alguns casos, porém não esqueçamos que nesse grupo estão maioritariamente pais interessados, tanto que se dispõem a pagar elevadas quantias. Consequentemente o acompanhamento que fazem dos seus filhos será totalmente diferente do grupo de pais do público onde há de tudo, dos interessados aos ausentes.
Comparar resultados obtidos com matéria-prima diferente é leviano, para não dizer mesmo propositadamente enganoso.

10/03/2007

E ninguém os mutila???


A insensibilidade da política (e a sua propaganda)
Os direitos andam a ser retirados a toda a gente, e agora chegou a vez em que esses direitos são retirados às pessoas portadoras de deficiência – na mesma altura em que o governo divulga exactamente o contrário. Não há limites para o poder da televisão e dos meios de comunicação. Isso toda a gente sabe. O que não nos lembramos é que esses meios, quando utilizados por um governo, também eliminam os limites do poder pessoal do Primeiro-Ministro.
O que o governo tem feito nas televisões – muito para além da contenção jornalística nos telejornais – ultrapassa em muito o tolerável. Desde entrevistas sem conteúdo e sem “perigo” para os elementos do governo de José Sócrates a anúncios de televisão propagandeando todo o tipo de medidas, e “não-medidas”, da legislatura socialista, o Partido Socialista tem-nos atirado areia para os olhos em quase todas as áreas em que é possível haver um dedo do Estado. Se pensa que está livre da acção governativa, livre-se de pensar assim, pois provavelmente já fizeram alterações graves ou incipientes (não sei qual será a pior hipótese) na sua área enquanto lhe diziam que era uma “reforma” por si, seja sob a forma de “reforma pelos trabalhadores”, “reforma pelos cidadãos”, “reforma pela modernidade” ou algo tão ou mais impessoal do que essas expressões.

Mas o que eu não sabia, há uma semana atrás, era que se podia descer tão baixo. Eu já sabia que a história de computadores “oferecidos” por cerca de 150 euros a alunos e professores não era bem assim (afinal, é preciso depois pagar o valor total do computador ao longo de um par de anos), mas sendo eu do tempo em que se estudava pelos livros, não fiquei extremamente escandalizado com a propaganda enganosa. Já sabia isso, mas o que eu não sabia que o Estado se tornou um verdadeiro “inimigo público nº 1”. E quando digo inimigo público, quero dizer que o Governo de Sócrates se tornou, exactamente, inimigo dos portugueses. Sejam eles cidadãos sem dificuldades físicas ou, sobretudo, portadores de alguma deficiência ou condicionamento físico.

Sob a imagem de “amiguinho dos deficientes”, Laurentino Dias, Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, deu a cara no dia 11 de Agosto deste ano, em Leiria, por uma campanha bem floreada: “Todos Diferentes, Todos Iguais”. E a pedra de toque dessa campanha era esta frase: “Quando vês deficiência física ou mental não vês a pessoa”. Esse dia teve direito a festarola, balões, associações do governo ou pagas pelo governo (logo, bico calado em relação às queixas), jogadores de futebol solidários, etc. Enfim, tudo o que fica sempre bonito numa acção oficial. Ou, traduzindo “acção oficial”: propaganda. Para além disso, sob uma máscara de solidariedade, o Governo (atenção, sublinho “Governo” e não apenas “Estado”, porque o agressor tem cara) decidiu pôr na rua, e sobretudo nas avenidas de Lisboa, há já algum tempo, o respectivo cartaz de propaganda ao tão badalado dia. Até aqui tudo muito bem, tudo pintadinho dentro das linhas, sem borrar a imagem. Toda a gente gosta de ver isto: o pai (Estado) dando a mão às crianças (nós), para que um dia mais tarde as crianças agradeçam. O problema é que isto não passa de uma manobra de diversão.

No dia 16 de Setembro, no entanto, o Correio da Manhã mostrava uma notícia diferente do que esperavam aqueles que se maravilharam com a festa do senhor Secretário de Estado Laurentino Dias. “Mais difícil obter isenção de imposto” para os deficientes, dizia a notícia. Ou seja, se já assistiu a casos em que pessoas com cancro são obrigadas a ir dar aulas, pessoas sem saúde são obrigadas a trabalhar até morrer e doentes que perderam a capacidade da fala são obrigados a discursar na escola, então oiça mais esta. A partir de agora, segundo a nova legislação aprovada no Verão (quando todos estávamos distraídos e pensávamos que os ministros socialistas estavam calmos), o português com deficiência que quiser ter benefícios – aos quais eu não chamo benefícios mas sim “direitos” –, sobretudo a nível fiscal, terá de se auto-mutilar até atingir os níveis mínimos que as juntas médicas (esse tenebroso e jacobino grupo de vampiros) vão passar a pedir. Se tem deficiência motora e precisa de um carro para chegar ao emprego ou, simplesmente, para fazer a sua vida sem dificuldades, terá de provar que é mesmo incapacitado. Ou seja, os já vagos 60% de incapacidade que antes se pediam para se “qualificar” como deficiente vão passar a ser mais vagos, já que agora terá de mostrar, e cito, “dificuldade elevada” na locomoção.

Passo a explicar, se o leitor não tiver uma perna, por acidente ou doença, é bem possível que lhe atribuam apenas 50% de incapacidade, já que metade de duas pernas equivale a 50% das mesmas, e uma das pernas o leitor ainda tem. Se ainda não tem carro, então vai ser mais difícil comprar um com a isenção, que merece e deve reclamar, do Imposto Automóvel (IA). Imagine-se o absurdo: se não mostrar que a sua incapacidade é tanta que não consegue sequer conduzir, então será mais difícil para si comprar um carro com o desconto que todos deviam ter. Humberto Santos, presidente da Associação Portuguesa de Deficientes (APD), lembrou a aprovação do Orçamento de Estado para 2007 em que, “pela primeira vez em 30 anos o Governo reduziu de forma substancial os benefícios fiscais” consignados pela legislação aos cidadãos com deficiência.

Resumindo, as juntas médicas, que já tinham poder sobre as nossas vidas, vão passar, cada vez mais, a ser agentes da política deste governo, actuando a seu bel-prazer sobre os nossos direitos, adquiridos ao longo destas escassas mas esforçadas três décadas. Seja deficiente ou não, tenha ou não familiares a precisar de um carro para minimizar as suas dificuldades de locomoção, este é, de facto, um ataque à sua condição de “Cidadão da República Portuguesa” (veja no Bilhete de Identidade que é mesmo), com a agravante de lhe dizerem que estão a fazer o contrário.

O dinheiro que gasta em impostos, em vez de ser aplicado em melhorar a vida de todos nós – como seria o caso de permitir que uma pessoa com deficiência não seja obrigada a apanhar o autocarro para o emprego – anda a ser utilizado para pagar a propaganda que não nos deixa ver o que está a acontecer no país, e “ao país”. Não se deixe ser enganado. Se não por si, então pelos outros: peça os seus direitos de volta. Este país é nosso e não de José Sócrates.
"Joao Carlos Silva"
 
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